Por Carlos J. Magliano Neto
Encerrando o tema da Virgindade Perpétua, o senhor coloca na página 32 quatro textos a fim de convencer o leitor de que Maria teve outros filhos após o nascimento de Jesus. Vamos analizá-los:
“Não vi nenhum apóstolo, mas somente Tiago, o irmão do Senhor” (Gl 1,19).
Certamente é dúvida corrente: se os “irmãos de Jesus” não são irmãos consangüíneos, como propõe a Igreja Católica, então quem são eles?
Peguemos mais uma vez o texto de Mateus 13,55: “Ele não é o filho do carpinteiro? Não se chama a mãe dele Maria e os seus irmãos Tiago, José, Simão e Judas?”. Analisaremos agora calmamente não só a Tiago, o irmão do Senhor, mas também a José, Simão e Judas, também irmãos do Senhor.
A exegese atual do Novo Testamento vê a presença de três personagens com o nome de Tiago. O primeiro deles é TIAGO MAIOR, filho de Zebedeu e Salomé (cf. Mc 15,40, compare com Mt 27,56) e irmão de João evangelista (cf. Mc 3,17). Este Tiago, juntamente com seu irmão João e Pedro, formava o grupo de apóstolos mais íntimos de Jesus (cf. Mt 17,1). Morreu como mártir por volta do ano 44 (cf. At 12,2).
O segundo é TIAGO MENOR (título que na verdade pertence a Tiago, o irmão do Senhor [cf. Mc 15,40], a quem analisaremos logo abaixo com o título de Tiago Pequeno. Estes dois em algumas interpretações são entendidos como sendo a mesma pessoa). Tiago Menor é filho de Alfeu (cf. Mt 10,3). Na Bíblia seu nome aparece apenas na listagem dos Apóstolos.
E o terceiro é finalmente TIAGO, O IRMÃO DO SENHOR, que agora comumente se chama de Tiago Pequeno. É filho de Clopas e uma outra Maria (cf. Jo 19,25, compare com Mc 15,40) e irmão de Joset (cf. Mt 27,56) que também é chamado de irmão do Senhor no texto em Mt 13,55. Segundo Hegesipo, o mais antigo historiador da Igreja, Clopas, seu pai, é irmão de São José (Eus. Hist. Eccl. 3,1.2). Sendo assim, Clopas é tio de Jesus e conseqüentemente, seus filhos Tiago e José, são primos de Jesus. Tiago, o irmão do Senhor, não era apóstolo, visto que ele mesmo não se dá esse título em sua carta (cf. Tg 1,1) diferentemente de Pedro (cf. 1ª Pe 1,1) e Paulo (cf. Tt 1,1). Em certa ocasião, Pedro, a quem Jesus colocou como líder da Igreja (cf. Mt 16,18), precisou fugir de Jerusalém (cf. At 12,17) e assim, Tiago, o irmão do Senhor, assume a igreja de Jerusalém, certamente por ser o mais próximo a Jesus, pois era seu primo (cf. Gl 2,9). Segundo relatos históricos, morreu apedrejado na Páscoa de 62. Sendo assim, este Tiago a quem se chama de irmão do Senhor, nada mais é que primo de Jesus. Inclusive, como se fala da morte de São José antes do início da vida pública de Jesus, Maria Santíssima e seu Filho podem ter ser mudado para a casa de Clopas, tornando-se assim uma só família.
O outro “irmão do Senhor” chamado Judas provavelmente é o autor de Carta de Judas do Novo Testamento, pois este também não era apóstolo: não se dá esse título (cf. Jd 1) e se diferencia deles (cf. Jd 17). Por isso não deve ser confundido com o Apóstolo Judas Tadeu (cf. Mt 10,3); com Judas Iscariotes (cf. Mt 27,3-9); com Judas de Damasco (cf. At 9,11); com Judas, o galileu (cf. At 5,37) e nem com Judas Barsabás (cf. At 15,22). Interessante que na Carta, Judas apresenta-se como sendo “irmão de Tiago” (Jd 1,1). Certamente é Tiago, o irmão do Senhor, bispo de Jerusalém, pois, Judas mencionaria alguém conhecido. Como já disse, Tiago, o irmão do Senhor, é filho de Clopas e de uma outra Maria e irmão de Joset. Assim sendo, os irmãos do Senhor, Tiago, Judas e Joset são sobrinhos de São José, primos de Jesus, irmãos no linguajar grego semítico.
No que se refere a Simão, o outro irmão de Jesus, pouco é sabido dele. No entanto, deve-se diferenciá-lo de Simão Pedro (cf. Jo 1,42); de Simão, o zelota (cf. Mc 3,18); de Simão, o leproso (cf. Mc 14,3); de Simão, o fariseu (cf. Lc 7,36-50); de Simão de Cirene (cf. Mc 15,21); de Simão Iscariotes (cf. Jo 6,71); de Simão, o feiticeiro (cf. At 8,9-13) e de Simão, o curtidor (cf. At 9,43). Simão, o irmão do Senhor, foi o segundo bispo de Jerusalém, na morte de seu irmão Tiago Pequeno. Mais uma vez segundo Hegesipo, ele era também filho de Clopas, assim, ao lado de seus irmãos Tiago, Judas e Joset, era também primo do Senhor.
Podemos, para ficar mais fácil, esboçar o seguinte esque-ma:
Jacó – avô paterno de Jesus (cf. Mt 1,16)
pai de
Clopas irmão de José
casado com Maria casado comMaria Ssma.
Tiago
Jose primos de Jesus Cristo
Judas
Simão
Em Jo 19,25 ainda há um detalhe: “Perto da cruz de Jesus, permaneciam de pé sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria, mulher de Clopas...”, na interpretação mais óbvia percebe-se que a mulher de Clopas é irmã de Maria Santíssima. O que faz com que o parentesco entre os filhos de Clopas e Jesus seja cada vez mais próximo, porém não são irmãos no sentido primeiro da palavra.
Finalizando, é importante ressaltar que a Verdade definida pela Igreja no Concílio de Latrão no ano 649 é decisiva: Maria é virgem antes, durante e depois do parto, tendo apenas um filho: Jesus Cristo, uma vez que a cristandade toda nisso acreditou desde os mais longínquos tempos. No entanto, os estudos teológicos sobre a identidade exata de cada um dos irmãos do Senhor ainda estão em processo de caminhada e aprofundamento, pois “cresce o conhecimento tanto das coisas como das palavras que constituem parte da Tradição” (Concílio Vaticano II, Constituição Dogmática Dei Verbum, 8). Além da explicação que demonstrei, ainda existem outras sobre o assunto que embora divergindo em alguns pontos, continuam a indicar a Virgindade Perpétua. A dificuldade de exatidão se dá porque os autores da Bíblia não pretenderam fazer um livro de biografia, mas sim “uma narração” (Lc 1,3), um relato sobre a Pessoa e os atos do Filho de Deus. Além do mais, eles escreveram seus Textos Sagrados muitos anos depois dos acontecimentos e basearam-se em várias fontes que poderiam divergir em pontos secundários. Por isso não se deve fazer uma leitura fundamentalista da Bíblia. Ela não erra enquanto fala de realidades divinas, porém, o modo de escrever e as palavras usadas para tratar dessa realidade estão presas ao tempo, à História e à cultura daquele povo.
Site: Universo Católico
Por Henrique Guilhon
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