Quanta lição de vida! Quanto aniquilamento amoroso que nos faz corar de vergonha diante de nossas exibições, aparências, exigências, julgamentos, condenações…
Jamais Ele se defende ao ser insultado e nunca revida quando é escarnecido. Isto não porque não pode, é porque não quer. Ele poderia do seu silêncio fulminar os sacrílegos que os arrastam para as missas negras ou o recebem sem “distinguir o seu Corpo e o seu Sangue”. Ele continua a repetir as palavras que disse a Pedro ao ser preso no Horto da Agonia: “Crês tu que não posso invocar meu Pai e ele não me enviaria imediatamente doze legiões de anjos?” (Mt 26,53). “Não hei de beber eu o cálice que o Pai me deu?” (Jo 18,11).
Na Eucaristia Jesus continua a beber o cálice que o Pai lhe deu, muito além da sua exigência. Bastava o Calvário para salvar-nos, mas Ele quis chegar ao “Calvário” do Sacrário, por nós.
Sim, meus irmãos, Jesus nos ama além de nossa imaginação. Ele não é um louco, nem um utópico, nem mesmo um masoquista que sofre por sofrer, e também não é um fantasioso vazio e irresponsável como muitos que enchem nossas livrarias e ruas. Não, Jesus é o Amor encarnado que, nos Altares e nos Sacrários continua a salvar o homem, de forma pessoal e misteriosa.
Fico pensando nas Hóstias que se perdem, por acidente ou abandono; quando apodrecem, os vermes a invadem e expulsam Jesus, pois Ele só permanece nas espécies enquanto elas estão intactas. A partir do momento que a Hóstia mal cuidada começa a se decompor, Jesus se refugia no pedaço ainda bom e trava, assim, como que uma luta com os vermes, mas sem lhes impor resistência.
É por isso que a Igreja recomenda que as Hóstias guardadas sejam regularmente consumidas para não se estragarem. Isto faz-nos lembrar as palavras do Profeta sobre Jesus: “Não sou mais um homem, porém um verme!” (Sl 21,7).
De fato Jesus desceu ao último degrau da criação na Eucaristia, pois, por não poder perder a substância própria, Ele se reveste exteriormente das simples espécies do pão e do vinho; é um enorme rebaixamento.
O Amor de Jesus por nós na Eucaristia é maior do que o da mãe pelo filhinho de colo: “O Senhor abandonou-me, o Senhor
esqueceu-me. Pode uma mulher esquecer-se daquele que amamenta? Não ter ternura pelo filho de suas entranhas? E mesmo que ela o esquecesse, eu não te esqueceria nunca”(Is 49,14-15).
Aniquilando a sua Glória na Eucaristia Ele está a nos dizer: “Sede humildes!”. Mas o aniquilamento de Jesus é positivo, produz frutos de salvação e dá glória a Deus. A humildade perfeita é a que devolve todo o bem a Deus, como a Virgem Maria. “Ele fez maravilhas em mim, Santo é o Seu Nome” (Lc 1,49).
Ser humilde é reconhecer que sem Deus não somos nada e não podemos nada. Quanto mais subimos na graça, mais descemos na humildade.
A Eucaristia nos ensina a render a Deus toda a glória e toda grandeza, mais até do que nos humilhar das nossas misérias.
Na Eucaristia Jesus não está inerte e inoperante; ao contrário, continua a obra da salvação. Ali Ele continua a dizer o Sim que mantém o universo e a criação. O Pai lhe entregou todas as Nações da terra; então, só através Dele opera no mundo. “Tu és meu filho, eu hoje te gerei. Pede-me, dar-te-ei por herança todas as nações; Tu possuirás os confins do mundo. Tu as governarás com cetro de ferro, Tu as pulverizarás como um vaso de argila” (Sl 2,7-9).
Diante do “Rei das Nações”, escondido e aniquilado na Hóstia, é o melhor lugar para viver o que diz o Salmo:
“Servi ao Senhor com respeito e exultai em Sua Presença; prestai-lhe homenagem com temor.” (Sl 2,11)
Do Sacrário Ele governa o universo, mas não como os reis da terra, pelo medo, pela pompa e aparatos que impressionam, não; Ele governa pelo Amor. Milhões de Anjos o servem, para cumprir as Suas ordens, mas esta glória está oculta. É com esta humildade que se deve exercer o poder. Ele governa a todos, mas visivelmente não dá ordens a ninguém, mas usa os seus semelhantes fiéis. Até a Sua oração é uma oração aniquilada.
Ele ensinou os Apóstolos a rezar, mas aqui o Suplicante maior ora no mais absoluto silêncio. Assim como uma esponja comprimida jorra toda a água que contém, Ele se oprime para que todo o seu Amor jorre sobre nós.
Ele é o modelo perfeito da alma contemplativa; o contemplativo está a sós e não se dá a conhecer, recolhe-se, concentra-se, e sua oração é poderosa porque se assemelha à de Jesus eucarístico. Ninguém precisa tanto da Eucaristia como os contemplativos; um só dia sem Ela seria um sofrimento.
Para que a vida inteira seja forte, é preciso imolação dos sentidos e silêncio, como a Vida aniquilada de Jesus. Sabemos que Ele não sofre mais na Hóstia, mas coloca-se em permanente estado de sacrifício. Assim também o contemplativo, mesmo que não sofra, se permanecer no estado e na vontade de sacrifício está muito mais na vontade do que na dor do mesmo. O mérito aumenta com o repetir e o continuar o sacrifício.
O grande mérito está na decisão, no primeiro passo, revestindo-se do estado de vítima. É o que Jesus fez ao instituir o Sacramento. Seu mérito é inesgotável porque a sua vontade atingia a todos os tempos e lugares; e, livremente, Ele tudo aceitou. A separação do Corpo e do Sangue do Senhor na Missa foi a maneira que Ele encontrou para perpetuar o Seu Sacrifício através da Sua Igreja, da forma como faziam os judeus ao separar o corpo e o sangue das vítimas.
Das lições de Jesus eucarístico, a mais forte parece a que nos ensina a esconder dos homens os nossos padecimentos, para que não se apiedem de nós e nos louvem, o que seria um grande mal. Ele nos ensina a ocultar os bons atos e não receber louvores merecidos. Importa antes mostrar apenas a parte fraca das nossas obras. Quanto mais nos rebaixamos, mais Jesus Cristo cresce, como disse João Batista: “Importa que Ele cresça e eu desapareça”(Jo 3,30).
Jesus é modelo de humildade na Eucaristia; não sente a menor indignação com quem o despreza, o injuria, ou o abandona; de todos se compadece porque a todos quer salvar e socorrer; antes se entristece pelo pobre estado dos pecadores.
Esta é a humildade dos que desejam ajudá-lo a salvar almas. Jesus é manso; não se irrita. Nós, ao contrário, irritamo-nos muitas vezes, por pensamentos e julgamos apressadamente as pessoas sob a nossa ótica pessoal, e muitas vezes abatemos a quem se opõe a nós. Estamos ainda longe da mansidão do Cordeiro imolado e sacramentado. Somos traídos pelo amor-próprio, que só vê os próprios interesses. Felizmente Jesus não julga-nos senão segundo a Sua mansidão e misericórdia.
No silêncio de Jesus revela-se a Sua profunda mansidão. Ele que veio para regenerar o mundo, no entanto, passou trinta anos no maior silêncio; contentou-se a rezar e a obedecer os pais no trabalho. Sem dúvida muito ouviu: a sua Santa Mãe, os rabinos, os doutores da Lei, como um simples israelita silencioso na Sinagoga. Nada censurou, nada criticou, porque não havia ainda chegado a sua hora. Ele que é a Verdade, esperou a hora do Pai, e honra-o pelo silêncio e humildade.
Essa mansidão continua na Eucaristia. Em silêncio vê tantas lágrimas derramadas, sente a necessidade de cada um, ouve a miséria de cada alma e a todos atende, individualmente, seja grande ou pequeno. A todos dá a graça adequada e deixa-as na paz.
Prof. Felipe Aquino
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Sobre Prof. Felipe AquinoO Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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