Poucos dias após a renúncia de Bento XVI e a eleição do Papa Francisco, o seriado "Evidências", produzido pela TV Novo Tempo (ligada à igreja Adventista, contando com o apoio cultural da sua Casa Publicadora Brasileira [30:18]), dedicou todo um programa à "História do Papado"[0], apresentado e narrado pelo "teólogo e arqueólogo" Rodrigo Silva [00:34 / 30:13] que, segundo afirmava, pretendia "contar um pouco da história dos Papas" [01:27], expondo as coisas segundo "fatos históricos, bíblicos e proféticos" [27:27].
Continuando
3º) Pedro "jamais foi o topo da lista ou Papa dos demais Apóstolos. Não há nada, nenhuma indicação histórica ou bíblica que aponte para uma liderança, digamos, 'papal' de Pedro" [04:23]
Ao contrário, Pedro encontra-se sempre no topo das listas bíblicas. Basta uma simples leitura para comprová-lo documentalmente:
- Mateus 10,2-4: "Eis os nomes dos doze apóstolos: O PRIMEIRO, SIMÃO, CHAMADO PEDRO; depois André, seu irmão. Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão. Filipe e Bartolomeu. Tomé e Mateus, o publicano. Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu. Simão, o cananeu, e Judas Iscariotes, que foi o traidor".
- Marcos 3,14-19: "Designou [Jesus] doze dentre eles para ficar em sua companhia. (...) Escolheu estes doze: SIMÃO, A QUEM PÔS O NOME DE PEDRO; Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, aos quais pôs o nome de Boanerges, que quer dizer Filhos do Trovão. Ele escolheu também André, Filipe, Bartolomeu, Mateus, Tomé, Tiago, filho de Alfeu; Tadeu, Simão, o Zelador; e Judas Iscariotes, que o entregou".
- Lucas 6,13-16: "Ao amanhecer, chamou os seus discípulos e escolheu doze dentre eles que chamou de apóstolos: SIMÃO, A QUEM DEU O SOBRENOME DE PEDRO; André, seu irmão; Tiago, João, Filipe, Bartolomeu, Mateus, Tomé, Tiago, filho de Alfeu; Simão, chamado Zelador; Judas, irmão de Tiago; e Judas Iscariotes, aquele que foi o traidor".
- Atos 1,13: "Tendo entrado no cenáculo, subiram ao quarto de cima, onde costumavam permanecer. Eram eles: PEDRO e João, Tiago, André, Filipe, Tomé, Bartolomeu, Mateus, Tiago, filho de Alfeu, Simão, o Zelador, e Judas, irmão de Tiago".
Além disso, há inúmeros testemunhos históricos, bem do início do Período Patrístico (que o programa, por pura conveniência, faz questão de ignorar), apontando Pedro como a pedra sobre a qual Cristo fundou a Sua Igreja e como origem da instituição do Papado. Cito apenas duas:
- "Foi ocultado algo a Pedro, que foi chamado 'pedra sobre a qual a Igreja seria edificada', que obteve as chaves do Reino dos Céus e o poder de desligar e ligar nos céus e na terra?" (Tertuliano de Cartago, +220; Da Prescrição dos Hereges 22,2-4).
- "[Os hereges] se atrevem a atravessar o mar [Mediterrâneo] para levar cartas de cismáticos e profanos à cátedra de Pedro e Igreja principal, de onde provém a unidade do sacerdócio. Esquecem, porém, que são esses mesmos romanos que tiveram sua fé louvada pelo Apóstolo e [são] inacessíveis à perfídia" (Cipriano de Cartago, +258; Carta 59,14).
Por isso concluía magistralmente o grande Doutor de Hipona, Santo Agostinho (+430):
- "Quem ignora que o príncipe dos Apóstolos é o bem-aventurado Pedro? (...) A Igreja atua em bendita esperança até nesta vida problemática, e esta Igreja (...) foi personificada no Apóstolo Pedro, por conta do primado que obteve dentre os Apóstolos" (Tratado sobre João 56,1; 124,5).
Quem disse então que a primazia de Pedro não encontra eco na Bíblia e na História???
Para mais referências do Período Patrístico, recomendamos a leitura do livro "A Fé Cristã Primitiva - Coletânea de Sentenças Patrísticas", que pode ser adquirido no Clube de Autores[6].
Finalmente, para concluir esta parte da refutação, devemos observar que a doutrina católica sobre o Papado não se fundamenta apenas nessas "4 razões" apontadas pelo programa adventista. Muito pelo contrário, sustenta-se bíblica e historicamente em dezenas e mais dezenas de argumentos. Dave Armstrong, por exemplo, cita 50 razões apoiando-se tão somente na Bíblia[7]!
3. ACUSAÇÕES CONTRA A INSTITUIÇÃO DO PAPADO QUE DESPREZAM A DOUTRINA CATÓLICA
Após tentar oferecer contra-argumentações para só 4 argumentos católicos que justificam a instituição do Papado, o programa passou a apresentar contra-argumentos contra o "regime papal", "fundamentando-se" na Bíblia e, paradoxalmente, em diversas fontes extrabíblicas.
Sim, dizemos "paradoxalmente" porque sendo os Adventistas do 7º Dia uma denominação protestante (muito embora muitos protestantes neguem isto), deveriam contra-argumentar apelando "apenas para a Bíblia" (=doutrina da "Sola Scriptura"), como todos os demais protestantes[8]. Ora, socorrendo-se agora de fontes extrabíblicas, em especial dos Padres da Igreja (sendo que todos eles eram católicos!!!), verifica-se que na prática a "Sola Scriptura" é insuficiente para os Adventistas demonstrarem que a antiquíssima instituição do Papado seria uma doutrina errônea.
Deploravelmente, quando a maioria dos protestantes questionam os católicos, exigem que apresentemos as nossas razões "usando apenas a Bíblia" (sendo que a própria Bíblia não ensina nem exige isto!!!); porém, entre eles, internamente, também precisam apelar para o seu "magistério" e para as suas "tradições" denominacionais, de modo que também não aplicam a "Sola Scriptura" que afirmam observar...[9]
Vamos aos contra-argumentos:
a) "Fundamentados" na Bíblia
1º) Jesus advertiu aos Apóstolos que não se deixassem ser chamados de "pai", porque só Deus é Pai (cf. Mateus 23,1-12); no entanto, curiosamente, o líder católico se denomina "Papa", que quer dizer "Pai" em latim [09:17].
Ok. Historicamente, convém lembrar que o termo latino "papa" provém do grego "papas", variação de "pappas", que quer dizer "pai". Nos primeiros séculos do Cristianismo, o título era aplicado a todos os bispos, como expressão de afeto. Com o tempo, passou a ser empregado apenas para o Bispo de Roma, em virtude da sua peculiar posição como sucessor de São Pedro, pastor de toda a Igreja e Vigário de Cristo sobre a terra.
A contra-argumentação apresentada é tão simplista que o que realmente faz, na verdade, é isolar tal afirmação de Cristo do seu contexto. Com efeito, quando Jesus diz que "não devemos chamar ninguém de pai", está tratando de um assunto bem diferente: da hipocrisia dos fariseus e doutores da lei, que punham Deus de lado e se colocavam ilegitimamente no Seu lugar, como podemos facilmente observar pelos versículos 6 e 7. Estes eram totalmente obcecados pelo respeito e louvor humanos. O que Cristo quer para os seus líderes é que sejam humildes: que se contemplem como realmente são, que contemplem os outros como realmente são e que contemplem a Deus na verdade, como realmente Ele é (cf. Santa Teresa d'Ávila).
Ora, se realmente não pudéssemos chamar ninguém de pai, teríamos que riscar o Mandamento divino que diz: "Honra teu PAI e tua mãe, para que teus dias se prolonguem sobre a terra que te dá o Senhor, teu Deus" (Êxodo 20,12). Mas será que os Adventistas - que nos acusam e se apegam tanto à letra dos Dez Mandamentos (a ponto de ignorar solenemente o espírito da Lei) - concordariam com isto?
Estudando melhor o assunto, o Pe. Mitch Pacwa[10] apontou que "Existem cerca de 144 ocasiões no Novo Testamento onde o título "pai" é empregado para alguém que não seja Deus: para os patriarcas de Israel, para os pais de família, para os líderes judeus e para os líderes cristãos". Não a toa, portanto, que o próprio São Paulo escreve aos fiéis cristãos, na condição de "pai espiritual":
- "Não vos escrevo isto para vos envergonhar, mas para admoestar-vos como a filhos queridos. Pois, embora tenhais como cristãos dez mil instrutores, não tendes muitos pais. Anunciando a boa notícia, eu vos gerei em Cristo" (1Coríntios 4,14-15).
- "A Timóteo, meu verdadeiro filho na fé: Graça, misericórdia e paz da parte de Deus nosso Pai, e da de Cristo Jesus, nosso Senhor" (1Timóteo 1,2).
- "A Tito, meu verdadeiro filho, segundo a fé comum: graça, misericórdia, e paz da parte de Deus Pai, e da do Senhor Jesus Cristo, nosso Salvador" (Tito 1,4).
- "Peço-te por meu filho Onésimo, que gerei nas minhas prisões" (Filemon 1,10).
E não só Paulo... O Apóstolo João também se dirigia aos cristãos chamando-os de"Filhinhos" (cf. 1João 1,2).
Ora, se os cristãos não pudessem mesmo chamar ninguém de pai, o primeiro Mártir da Igreja, Santo Estêvão, não teria cometido "erro tão crasso":
- "E ele disse: 'Homens, irmãos e PAIS, ouvi: O Deus da glória apareceu a nosso PAI Abraão, estando na Mesopotâmia, antes de habitar em Harã" (Atos 7,2).
...nem, muito menos, o experimentadíssimo São Paulo (pois, vindo de um Apóstolo que instrui as igrejas na reta Fé, isso seria totalmente injustificável):
- "Homens, irmãos e PAIS, ouvi agora a minha defesa perante vós" (Atos 22,1).
- "Portanto, é pela fé, para que seja segundo a graça, a fim de que a promessa seja firme a toda a posteridade, não somente à que é da lei, mas também à que é da fé que teve Abraão, o qual é PAI de todos nós" (Romanos 4,16).
Com efeito, considerando que os católicos, ao se dirigirem ao Papa, não estão atribuindo a ele aquele significado que designa propriamente o Pai celeste, mas sim usando um termo que meramente indica respeito, reverência e afeto, de que realmente é legítimo merecedor, é mais do que óbvio de que não há problema nenhum nisto, caso contrário os protestantes também não poderiam chamar seus líderes de "pastores" já que, pela Bíblia, somente Cristo é "o Bom Pastor" (cf. João 10,11.14).
2º) Quanto às chaves dadas por Jesus a Pedro, com o poder de ligar e desligar no céu e na terra, "esse mesmo elemento" foi conferido em outras passagens bíblicas "a todos os discípulos de Cristo e não apenas a um deles" (cf. Mateus 18,18; João 20,23; Apocalipse 1,18) [09:51].
Reproduzamos, então, as passagens bíblicas citadas pelo programa:
- Mateus 18,18: "Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra será desligado no céu".
- João 20,23: "Aqueles a quem perdoardes os pecados lhes são perdoados; e àqueles a quem os retiverdes lhes são retidos".
- Apocalipse 1,18: "Eis que vivo e fui morto, mas eis aqui estou vivo para todo o sempre. Amém. E tenho as chaves da morte e do inferno"
Em Mateus 18,18 e João 20,23, Jesus está se dirigindo aos Apóstolos como um todo. No entanto, nestas duas passagens não se fala nada das "chaves do Reino dos Céus"; fala apenas das funções de ligar/reter e desligar/não reter, também entregues a Pedro em Mateus 16,16-19.
Apocalipse 1,18, por outro lado, fala das chaves da morte e do inferno. Portanto, estas NÃO são as "chaves do Reino dos Céus" e permanecem de posse plena do Senhor. Pretender que as chaves do Inferno sejam as mesmas do Céu é um verdadeiro estupro à Palavra de Deus.
Pois bem: como facilmente percebemos, SOMENTE Pedro recebeu as chaves do Reino; nenhum outro Apóstolo as recebeu (nem mesmo João, o "discípulo amado" e, cronologicamente, o último a falecer). E o que seriam essas chaves? Representam justamente a primazia sobre toda a Igreja: Pedro, recebendo as chaves do Reino, torna-se o legítimo representante de Cristo-Rei sobre a terra, da mesma forma como lemos em Isaías 22,22, onde o Rei Ezequias remove de Sobna as chaves da casa de Davi e as entrega ao seu novo sucessor Eliacim, que passa a ser então o novo mordomo ou vizir do reino de Israel e Judá, detendo todo o poder do Rei, exceto o seu próprio trono.
Continua
Título Original: "A História do Papado": Uma Refutação a um Programa de TV Adventista
Foto: Web
Site: Apologistas Católicos
Editado por Henrique Guilhon
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